Com 86 km de margens e mais de 20 mil passageiros transportados por mês, esse espelho d’água ainda está longe de contar com a infraestrutura necessária para atender sua crescente demanda turística.
O Lago Paranoá é, sem dúvida, um dos maiores símbolos de Brasília. Concebido ainda no plano urbanístico de Lúcio Costa e alimentado pelas águas represadas do Rio Paranoá, o lago artificial ocupa uma área de 48 km² e foi projetado não apenas como elemento paisagístico, mas também como regulador climático, reserva hídrica e espaço de convivência social. No entanto, mesmo sendo um bem público de valor inestimável, o Lago Paranoá continua sendo subutilizado e carente de investimentos que estejam à altura de sua importância estratégica para a capital federal.

Pôr do Sul visto do Pontão do Lago Sul, local que recebe mais de 450 mil pessoas por mês (Foto: João Carlos Bertolucci)
O lago é mais do que um cartão-postal: ele é uma adjacência do lar brasiliense, o verdadeiro quintal da casa dos moradores do Distrito Federal. A população, sobretudo nos fins de semana e feriados, busca suas margens para se reunir com amigos em um simples acampamento com churrasco, praticar esportes náuticos, caminhar, pedalar ou simplesmente admirar o pôr do sol. É um espaço democrático, acessível — pelo menos em parte — e de forte ligação afetiva com os que aqui vivem.
Com o projeto Orla Livre, que determinou o recuo das cercas de propriedades privadas que invadiam as margens do lago, o governo deu um passo importante no sentido de devolver o lago à população. Algumas áreas foram revitalizadas, criando novos espaços de lazer e circulação. No entanto, a verdade é que, mesmo com essa abertura, o Lago Paranoá segue sendo mal explorado do ponto de vista turístico, econômico e estrutural.
Os investimentos públicos e privados em infraestrutura nas margens do lago ainda são ínfimos diante de seu potencial. Falta um plano integrado que contemple não apenas a preservação ambiental, mas também o fomento ao turismo, a organização das atividades náuticas e a valorização do entorno. A ausência de estrutura básica, como píeres públicos organizados, sinalização náutica eficiente, áreas de apoio aos visitantes, sanitários, iluminação e segurança, compromete a experiência de quem deseja usufruir desse espaço com conforto e dignidade.

Transporte de passageiro no lago brasiliense, mais de 20 mil pessoas transportadas por mês (Foto: JCBertolucci)
Para se ter uma ideia do quanto o Lago Paranoá poderia render mais ao Distrito Federal, atualmente o turismo náutico transporta cerca de 20 mil passageiros por mês. Mesmo assim, não há sequer um local oficial e padronizado para o embarque e desembarque de passageiros. As atividades de navegação, muitas vezes improvisadas, ocorrem em locais sem infraestrutura adequada, o que além de causar desconforto, compromete a segurança de usuários e operadores. Isso sem contar o prejuízo ambiental decorrente da ausência de regras mais claras e fiscalização contínua.
Imagine se Brasília tivesse píeres turísticos em pontos estratégicos — Lago Norte, Lago Sul, Pontão do Lago Sul, Cabeceira Norte da Ponte JK, Península dos Ministros/Morro da Asa Delta, entre outros — interligados por linhas regulares de transporte náutico, com integração ao transporte terrestre, bares, restaurantes, feiras de artesanato, atividades culturais e esportivas. Imagine ainda a criação de parques lineares contínuos ao redor do lago, com ciclovias, áreas de convivência, centros de atendimento ao turista, serviços de aluguel de equipamentos náuticos e suporte técnico. Os empregos que isso geraria — diretos e indiretos —, a arrecadação de tributos, a atração de visitantes, a valorização imobiliária e a movimentação econômica seriam expressivos.

José Humberto Pires (Secretário de Governo do DF – à esquerda), Cristiano Araújo, Secretário de Turismo (à direita), em ocasião do evento Brasília Boat Show, ocorrido em novembro de 2024 – Foto: JcBertolucci
Com planejamento, o Lago Paranoá pode se tornar um verdadeiro vetor de desenvolvimento econômico e social. O turismo náutico e de lazer pode ser um dos grandes motores da economia local, sobretudo se vinculado a políticas de sustentabilidade, incentivo ao empreendedorismo e valorização da cultura brasiliense. Além disso, a requalificação das margens traria ganhos ambientais ao garantir a preservação do espelho d’água e o combate à ocupação irregular.
O Governo do Distrito Federal precisa enxergar o Lago Paranoá como um ativo estratégico de sua política de desenvolvimento. A população já reconhece sua importância simbólica e afetiva. Falta agora reconhecer — com ações concretas — seu valor econômico, turístico, ecológico e social. Com os investimentos certos, Brasília pode transformar esse imenso espelho d’água em um verdadeiro espelho de progresso, inclusão e qualidade de vida.